"Mesmo que as situações de vulnerabilidade no serviço, que a doutrina delimita na teoria finalista, não abranjam as alegações do autor, a decisão considerou que, no caso, a perda da chance de publicidade ensejaria a tipificação de conduta ilegal.
Ainda que uma empresa revendedora de veículos não possa ser equiparada a um consumidor final de serviços de telefonia, a fornecedora deve indenizar pelas falhas ocorridas no sistema. A 3ª Turma do STJ aplicou o direito à espécie para, mesmo afastando a incidência do CDC, manter a indenização por danos materiais que deve ser paga pela Embratel a uma revendedora de veículos, com fundamento no CDC.
Os problemas nos telefones do estabelecimento ocorreram em agosto de 2007, no Rio de Janeiro. A loja alegava que as falhas teriam comprometido seus investimentos em publicidade, causando danos materiais e morais. A sentença acolheu o pedido de devolução parcial dos valores, fixando o dano em R$ 26 mil.
A ministra Nancy Andrighi, inicialmente, apontou que o STJ tem acolhido a teoria finalista aprofundada nas relações de consumo. Por essa interpretação, pode ser equiparada a consumidor a organização que não retira o produto ou serviço de forma definitiva do mercado, desde que ocorra uma situação de vulnerabilidade. Assim, ainda que o consumo vise o lucro e se integre à atividade negocial, havendo vulnerabilidade da empresa contratante diante da fornecedora, podem-se aplicar as regras das relações consumeristas.
A relatora acrescentou que, tradicionalmente, a doutrina apresenta três tipos de vulnerabilidade: técnica, caracterizada pelo desconhecimento específico do produto ou serviço; jurídica ou científica, pelo desconhecimento jurídico, contábil ou econômico e suas consequências nas relações; e fática ou socioeconômica, que abrange situações de insuficiência física, econômica ou mesmo psicológica do consumidor. Além disso, a jurisprudência estaria acolhendo mais recentemente a vulnerabilidade informacional, como desdobramento autônomo da vulnerabilidade técnica. Ainda, conforme a magistrada, poderiam ser identificadas em cada caso outras formas capazes de atrair a aplicação do CDC.
No caso analisado, no entanto, nenhuma delas estaria presente. A própria revendedora alegava que o serviço fazia parte de sua cadeia produtiva, sendo essencial ao seu negócio. Por isso, também não poderia ser considerada destinatária final do serviço de telefonia.
A relatora avaliou que, afastada a legislação consumerista e não havendo necessidade de revisar as provas produzidas, poderia o próprio STJ aplicar o direito ao caso concreto, conforme autoriza seu regimento interno. Assim, evita-se o retorno dos autos à origem, privilegiando a economia processual e a duração razoável do processo, ambos princípios constitucionais. "Compulsando os autos, verifica-se que, apesar de terem aplicado o Código de Defesa do Consumidor, as instâncias ordinárias concluíram pela suficiência da prova carreada aos autos e pela existência de culpa da Embratel", afirmou a ministra.
Um documento juntado pela própria telefônica indica que não houve nenhum serviço prestado entre 9 e 22 de agosto daquele ano. A sentença também considerou que, entre os dias 1º e 9 daquele mês, foram registradas menos de quatro ligações diárias, e nenhuma entre os dias 10 e 21. Para a decisão primeira, isso evidencia a existência do problema apontado pela autora. A Embratel não pleiteou a produção de prova contrária. "Vale frisar que o juiz de 1º grau de jurisdição não se baseia exclusivamente no CDC para impor o ônus da prova à Embratel, tendo fundamentado sua decisão no fato de que cumpria a ela comprovar a suposta inexistência de falha na prestação do serviço, porque se trata de fato impeditivo do direito da autora", acrescentou a ministra.
A relatora afirmou ainda que não se trata de inverter ou não o ônus da prova, mas aplicar a teoria da distribuição dinâmica da carga probatória. Assim, a ré teria melhores condições de produzir prova de inexistência do defeito, do que a revendedora de provar tecnicamente sua ocorrência. Essa última prova poderia ser até mesmo impossível, segundo a ministra Nancy Andrighi. "Seja com for, constata-se que a prova carreada aos autos é suficiente para evidenciar a culpa da Embratel pelos danos suportados pela recorrida, sendo evidente que o defeito no funcionamento das linhas telefônicas tornou inócuo, nos dias em que perdurou o problema, o investimento realizado em publicidade", declarou.
Diante disso, apesar de, no caso particular, a condição de cliente não ser extensível à recorrida, a julgadora concluiu que não se vislumbra motivo para reforma da parte dispositiva da sentença, calcada na existência de culpa da companhia." (Processo nº: REsp 1195642 - Fonte: STJ -Publicação em 20/12/2012 - JO Jornal da Ordem - OAB/RS.)
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